Matemática em profissões inesperadas

PROFESSOR RENATO JOSE DA COSTA VALLADARES

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Renato J. Costa Valladares,
Professor e Escritor, é Doutor em Ciências e Mestre em Matemática.
 
RIO [ ABN NEWS ] — Há uma forte convicção na sociedade, que a Matemática é fundamental para diversas profissões. Ninguém, em sã consciência, nega sua importância para engenheiros, economistas, estatísticos, físicos, etc. Entretanto, com respeito a outras profissões esta convicção diminui muito ou, mesmo, desaparece.

Nossas pesquisas nos têm mostrado que esta diminuição não se justifica, uma vez que temos constatado uma presença marcante da Matemática no exercício das mais diversas profissões. Isto ocorre no emprego de métodos, técnicas, recursos matemáticos, ou ainda no uso da linguagem ou no jeito matemático de pensar. Em certos casos, este uso chega a ser surpreendente, como veremos no presente artigo. Devido às limitações de tempo e de espaço, nos restringiremos a umas poucas situações.

Para perceber o quanto o bom uso da Matemática é importante para os profissionais que se ocupam da informação, vejamos as seguintes notícias. Elas foram publicadas em jornais de grande circulação na região metropolitana do Rio de Janeiro.

Um jornal noticiou que “… o sedã se viu obrigado a recorrer à sua potência para superar inclinações de 70 graus…”. A equipe responsável pela publicação do jornal não se deu conta que havia um erro na notícia, já que um automóvel não pode superar uma inclinação de 70 graus. Se alguém na equipe tivesse usado a necessária sensibilidade geométrica, o erro seria evitado e o leitor do jornal seria melhor informado.

Em uma reportagem sobre botequins, dentre as muitas características destes estabelecimentos, destacava-se que os azulejos eram “assentados em losango”. Contrariamente à notícia anterior, nesta o repórter teve grande sensibilidade geométrica ao abrandar um pouco o rigor matemático na caracterização dos losangos e se valer da maneira como muitos autores de Matemática ilustram seus livros com figuras destes polígonos. Quem quer que tenha estudado em um destes livros, não terá a menor dúvida em concluir que os azulejos que revestem as paredes dos botequins são usualmente assentados com uma diagonal na vertical. Assim, usando sensibilidade geométrica, o jornalista atingiu plenamente seu objetivo de informar os seus leitores.

Outra notícia dizia que “… na fazenda Barriguda, de 4.900 hectares …”. Neste caso não foram dados elementos de comparação para o leitor aquilatar o tamanho da fazenda. Faltou sensibilidade matemática à equipe responsável pela publicação da notícia, para perceber que número é uma noção abstrata quando não está quantificando alguma coisa em uma ordem de grandeza com a qual o leitor esteja habituado a lidar. Assim, para um cidadão urbano médio (leitor típico daquele jornal) significa pouco, uma fazenda medir 1.000, 5.000 ou 10.000 hectares. A notícia devia ser complementada estabelecendo comparações com campos de futebol, praças ou parques.

É comum a observação do mesmo tipo de problema em notícias envolvendo grandes somas de dinheiro, quando os jornais noticiando grandes transações financeiras, falam de muitos milhões de dólares, ao cidadão comum, que está habituado com quantias bem mais modestas. Neste caso, é interessante fazer comparações com objetos que o cidadão conheça bem e cujo preço seja de dezenas ou centenas de milhares de dólares. Por exemplo, automóveis ou apartamentos podem ser bons termos de comparação.

“Mede mais de três campos do Maracanã e pesa sete vezes mais que o Titanic”. Notícia acerca de uma plataforma de petróleo, onde se observa o oposto da notícia anterior. Neste caso, existem comparações esclarecedoras sobre a ordem de grandeza de tamanho e peso da plataforma. Estas são referências bem conhecidas do leitor médio daquele jornal. Entretanto, a notícia falha por não informar estas dimensões em unidades correntes de tamanho e medida.

A boa informação quantitativa deve cruzar dois parâmetros. No primeiro caso o leitor soube o tamanho da fazenda, mas não viu nenhuma comparação. No caso da plataforma houve comparações mas não houve a formalização dos padrões usuais de medida.

“O parque municipal de Nova Iguaçu mede 1,1 mil hectares, o que equivale a 10 aterros do Flamengo ou ao tamanho do bairro de Copacabana.”. Esta notícia está muito bem formulada, no que diz respeito à informação quantitativa. Comparando-a com as duas anteriores, podemos ver que ela expressa a área do parque em hectares que é uma unidade corrente de medida. Depois, para esclarecer o leitor a respeito da ordem de grandeza, faz comparações com um parque e um bairro situados no Rio de Janeiro, ambos muito conhecidos do leitor médio daquele jornal.

Parte deste material está no livro “O Jeito Matemático de Pensar”. O leitor interessado pode entrar em contato com o autor no e-mail rjcvalladares@gmail.com ou acessar o seu perfil no Facebook.