No Dia do Escritor: Andreia Donadon Leal estreia na ABN NEWS

A escritora Andreia Donadon Leal, cronista da AGÊNCIA BRASILEIRA DE NOTÍCIAS, e outros renomados jornalistas que também colaboraram com a ABN NEWS: Antônio Calado (1917-1997), Cecília Meireles (1901-1964), Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), Clarice Lispector (1920-1977), Érico Veríssimo (1905-1975), Fernando Pessoa (1888-1935), Humberto de Campos (1886-1934), Graciliano Ramos (1892-1953), José Lins do Rego (1901-1957), Mário de Andrade (1893-1945), Mário Quintana (1906-1994), Malba Tahan (1895-1974), Manuel Bandeira (1886-1968), Monteiro Lobato (1882-1948), Patrícia Rehder Galvão Pagu (1910-1962), Raul Bopp (1898-1984), Ruben Braga (1913-1990), Orígenes Lessa (1903-1986), Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), Ernest Hemingway (1899-1961), Jorge Luis Borges (1899-1986), Aldous Huxley (1894-1963), Stefan Zweig (1881-1942) e Thomas Mann (1875-1955).

 
 

MARIANA [ ABN NEWS ] — A partir desta segunda-feira, 25 de Julho (Dia Nacional do Escritor), a autora do Movimento de Arte Aldravista, Andreia Donadon Leal, passa a publicar semanalmente suas crônicas na Editoria de Cultura da ABN NEWS.

Com a presença e atuação de Andreia Donadon Leal na Agência Brasileira de Notícias, a primeira agência de notícias do país segue uma tradição iniciada em 1924: a de abrigar, em seus quadros de colaboradores, os mais expressivos e competentes escritores e, assim, dando continuidade a iniciativa de Américo Facó, um dos fundadores da ABN, que contratou em áureos tempos escritores importantes para promover a Literatura no país e no exterior.

Nomes como Antônio Calado (1917-1997), Cecília Meireles (1901-1964), Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), Clarice Lispector (1920-1977), Érico Veríssimo (1905-1975), Fernando Pessoa (1888-1935), Humberto de Campos (1886-1934), Graciliano Ramos (1892-1953), José Lins do Rego (1901-1957), Mário de Andrade (1893-1945), Mário Quintana (1906-1994), Malba Tahan (1895-1974), Manuel Bandeira (1886-1968), Monteiro Lobato (1882-1948), Patrícia Rehder Galvão Pagu (1910-1962), Raul Bopp (1898-1984), Ruben Braga (1913-1990), Orígenes Lessa (1903-1986), Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), entre outros, participaram ativamente das páginas da ABN, produzindo reportagens sobre a vida, criando um clima de familiaridade e ligação entre o escritor e o leitor. Naquela época a ABN contava, também, em suas sucursais no exterior, com a colaboração de Ernest Hemingway (1899-1961), Hermann Hesse (1877-1962), Jorge Luis Borges (1899-1986), J.D. Salinger (1919-2010), Truman Capote (1924-1984), Aldous Huxley (1894-1963), Stefan Zweig (1881-1942), Thomas Mann (1875-1955) e outros. Nomes de peso nas áreas literária e intelectual no país e no mundo deram voz às seções especiais sobre Literatura nas páginas da ABN, relatando de forma artística, fatos colhidos do cotidiano. A ligação entre o escritor e o leitor, naquela época, não contava com o computador e a internet, de forma que a leitura se restringia àqueles que podiam adquirir jornais ou livros impressos. Com o advento do computador e da internet, a leitura passa a não ter fronteiras e limites, em diversos formatos, possibilita a todos, entrarem por infinitas portas e janelas. A ABN NEWS acompanha o ritmo contemporâneo, implementando sua seção de crônicas, com a participação da principal cronista do Movimento de Arte Aldravista, Andreia Donadon Leal, que falará artisticamente, de fatos colhidos do cotidiano, com pinceladas poéticas, humorísticas e nostálgicas.

Andreia Donadon Leal, autora do Movimento de Arte Aldravista, publicou 15 livros de ensaios, literatura infantojuvenil, contos, crônicas e poesias. Natural de Itabira, vive atualmente na cidade de Mariana – MG. É formada em Letras pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), Pós-graduada em Artes Visuais: Cultura e Criação, Mestre em Literatura pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). É membro efetivo da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, da Academia de Letras, Artes e Ciências Brasil (ALACIB-Mariana), Benemérita da Academia Feminina Mineira de Letras, Membro da Aldrava Letras e Artes. Curadora da Casa da Arte Aldravista e Coordenadora do Projeto Poesia Viva: a poesia bate à sua porta, na cidade de Mariana – MG. Vencedora do Troféu Rio – Personalidade Cultural 2016 – UBE-RJ.

Para estrear, leia a crônica inédita “Encontro de colegas depois de duas décadas”

Encontro de colegas depois de duas décadas

Andreia Donadon Leal

Outro dia encontrei, por acaso, uma colega da época do ginásio, numa loja de roupas. Não esqueço o rosto dessas figuras, que marcaram minha adolescência. Formosa, inteligente e astuta, naquela época. Criada na rédea curta pelo pai, homem de poucos amigos e de pouca conversa. Só saía de casa, que eu me lembre, para escola, médico, missa, e comemorações com presença da mãe (uma santa!), ou de toda família. Para um passeio de final de semana pelas praças, só com a presença dos irmãos robustos e meio abrutalhados. Coitada, a única mulher criada com toda frescura e impeditivos de liberdade. Mas como ninguém é santo o tempo todo (a carne é fraca!), de vez em quando, dava um perdido nas últimas aulas, comigo e as colegas. Saíamos discretamente, uma a uma, da sala de aula, deixando as mochilas debaixo das carteiras. A turma sabia do famoso périplo escondido pelas ruas, mas fazia boca de siri, graças ao pacto do silêncio. ‘Eu não te deduro. Você não me dedura. Nós não deduramos nossos colegas’. E assim íamos para as praças, meio escondidas, meio camufladas com touca ou lenço nas cabeças baixas, passando pelos cantos e por lugares poucos iluminados. Os pretendentes nos aguardavam para um bate papo, e quem sabe uns amassos. A Imaculada, colega-formosa-astuta, resolveu investir no melhor partido da época. Havia-me traído, sem saber, a espertalhona, roubando minha antiga paixão camuflada. Em pouco tempo, santa nem tão santa assim, conseguiu permissão do pai, para namorar o rapaz mais bonito e bem de vida, debaixo das asas e dos olhos atentos da família. Não, ela não engravidou! Ela não pulou o muro de casa, para sair às escondidas por aí com ele, para um amasso mais íntimo. Ela fez tudo como mandava o figurino de moça comportada, dona da moral e dos bons costumes (não coloco minha mão no fogo!), enquanto eu estabacava a cara com um ou dois namorados. Nada de casamento; um noivado sem graça e sem fim. E a Imaculada logo se casou, com pouquíssimo tempo de namoro. Moça de sorte. Fui ao casório (eu e metade da cidade) com uma ponta enorme de inveja; assumo, sem constrangimento. Casamento dos sonhos e mais badalado da cidade, o da Imaculada. Teve filhos, bonitos e saudáveis. Encontrei-a (que fique claro que o nome dela não é Imaculada!) depois de mais de duas décadas. Magricela, com resquícios de beleza da adolescência, sorriso suave no rosto enrugado e fino. Formosura carcomida com o passar dos anos. A pergunta de quem se encontra depois de muito tempo é quase a mesma de todo mundo.

“E aí, menina? Quanto tempo!”

Longe de mim parecer menina, mas foi a forma de tratamento, encontrada por Imaculada. Aprendi, com o tempo, a perguntar sobre a família, o pai, a mãe, os irmãos, os cachorros, as pulgas, os papagaios, os gatos, etc, para ter assunto. O melhor repertório de perguntas é este. Infalível, quando sabemos de antemão que marido, filhos, pais, irmãos, cachorros, papagaios, gatos, pulgas, etc, não morreram. Se tiver dúvida, melhor perguntar de forma genérica, para não passar vergonha.

“Como vai a família”?

“Todos bem, graças a Deus! Outro dia fiquei sabendo, pela minha filha, que você é escritora. Ela está lendo suas obras. Que orgulho! Disse pra ela que estudou comigo, e era a aluna que mais lia livros. Fiquei feliz! Contei pra ela que costumávamos passear pelas ruas. Só não contei que matávamos aulas! Não pega bem, né? Disse também que você fez o campo, para que eu e o pai dela nos casássemos. Lembra”?
“Se lembro, se me lembro! Lembro-me muito bem! Tempo bom! Obrigada pelo carinho”!

Obrigada pelo carinho? Eta frase sem propósito. Não me lembro de ter feito o campo de ninguém, mas vá lá. Não era hora de discordar, depois de duas décadas. Perguntei como estavam marido e família. Ela chamou-o imediatamente. Esfriei. Ainda tinha aquela capacidade idiota de esfriar a boca do estômago.

“Broto? Broto! Venha ver nossa amiga do ginásio!”

Ele veio, de má vontade, afinal, acompanhar mulher em loja de roupas, não é programa dos sonhos de nenhum homem. Compreendo perfeitamente. Quase não o reconheci. Tomei um baita susto. Disfarcei. O príncipe virou sapo! Deselegante, relaxado para se vestir. Passos arrastados, parecendo querer limpar o chão com as botas.

“Até que enfim apareceu, broto! Lembra da Andreia, filha do Didi?”

Broto? O que aconteceu com o vocabulário da Imaculada? O que aconteceu com sua visão? Ela tinha herdado minha miopia, também? Broto? Cadê o broto? Broto virou fruto passado do ponto.

“Lembro. E aí”? Disse, olhando-me com os olhos apertados.

“Agora ela virou Andreia Leal. Não tá reconhecendo, broto?”

Demorou a se lembrar, também pudera, eu bem diferente. Sem o aparelho ortodôntico (odiei usar aquilo!), sem os óculos de grau que pareciam fundo de garrafa (odiei usar os óculos, também!), sem a magreza excessiva (com alguns quilos a mais agora, nada fã da condição sobrepeso!), sem os olhos esbugalhados e os cabelos arrepiados (uma boa hidratação resolvia a gafurina.). Prefiro-me agora, apesar de que nunca fui bela. Olhei para ele, que estava de boca aberta. Capiau, sempre capiau, mordendo a ponta de um palito de dente.

“Ah! Sim, a Jacaroa! Como vai? Bom rever você. Mudou da água pro vinho! Escritora! As mulheres lá de casa adora ler. Ler é coisa de mulher! Continuo detestando livro. Nada pessoal, viu? Sou sincero, você sabe. Meu negócio sempre foi o trabalho, carvão. Ainda dá um troco bom! Escritora não deve ganhar muito, né? Mesmo assim, parabéns”!

O sobrenome era o apelido do meu pai (nunca me importei com isto!). O melhor partido da cidade tinha nenhum resquício de príncipe na aparência, mas um orgulho tosco (só fiquei sabendo agora!) em falar que detestava livros. Coitado do sapo! Fiquei tentada a dar um passa fora no burraiá machista, mas desisti. Perda de tempo. Fechei o bico, engolindo seco. Dei-lhe um sorriso quadrado, apertando-lhe a mão num cordial cumprimento. Faltavam-lhe dentes nas laterais; raríssimos fios de cabelos na cabeça; sobrava-lhe abdômen grande e dilatado. Ele revidou com a educação que tinha. Tive a impressão de que após o aperto de mão, iria cuspir no chão, como faziam os personagens dos filmes de Velho Oeste. Abracei a colega, me despedindo. A Imaculada (coitada da Imaculada, agora a sorrir tristemente!), que roubou minha paixão da adolescência, foi a melhor amiga que eu tive, concluí. Nunca me senti tão grata! Ocorreu-me ante o gesto de amizade dar-lhe um regalo à altura. Pensaria no presente com calma. Não iria morrer de remorso por ter amaldiçoado a Imaculada, durante anos. Acho que nunca notou meu ressentimento… Ainda bem, eu não poderia perder amiga tão nobre! Acreditem, ilustres leitores, dores de cotovelos e boas estabacadas com namoros mal sucedidos ou não correspondidos, em tempos idos e vividos, podem fazer um bem danado para o resto da vida. ‘(…) E viveram felizes e formosos para sempre’, de verdade? Somente nos livros. Nunca vivi um conto de fadas, mas que eu tive uma sorte danada, ah, eu tive! Graças à Imaculada. E que fique claro que a graça dela nunca foi Imaculada!